“Isto
era para lhe dizer que (principalmente desde esta história dos CTT –
ontem a meter no Rato uma encomenda de papelada para si, vi as caras
das raparigas – pareciam viúvas e não só por causa das batas
pretas: uns ares acabrunhados, cansados, humilhados, quase
envergonhados, inda que as reivindicações deles fossem exageradas)
já me sinto na Oposição ao Regime (actual). Ao fim de dois meses,
está-me a cheirar que estes Salvadores da Pátria (assim chamaram
também aos do 28 de Maio) não fizeram revolução nenhuma, mas uma
manobra de salvação própria e de classe (burguesa, capitalista,
monopolista, multinacionalista) e de casta (militar). E os 200
capitães, em coro, estão a representar o papel do ingénuo Gomes da
Costa e dos convictos honestos (Quintão Meireles e outros) do 28/5.
Mas a minha posição é de aguardar. A verdade é que não tive
grandes ilusões na primeira hora (a ler o livro do Spínola, semanas
antes, vi por ali muita utopia) nem as conservo. (...) Não se pode
exigir que quem governa faça tudo a um tempo e eles têm problemas
gravíssimos, instantes, e todos os dias novos. O que receio é a
convergência de interesses, e um movimento que vá retrogradando
para um regime à brasileira (aliás, foi o que esse aviador maluco,
Galvão de Melo, cuja cara de nazi chapado logo no dia 25 me chocou
pela TV, disse no Brasil).”
Pacheco, Luiz, O
Grilo na Varanda – Luiz Pacheco para Laureano Barros
(Correspondência, 1966-2001),
transcrição, introdução e notas de João Pedro George, Lisboa,
Tinta-da-China, 2017, pp. 145-146.
"O general Galvão de Melo, um dos membros da Junta de Salvação Nacional, acompanhado pelo Dr. Vasco Vieira de Almeida, delegado da Junta para o sector da Banca, à saída da Cova da Moura"
Abel Fonseca
1974
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