“Com a minha infância, se me permitem um depoimento formal, passa-se qualquer coisa de curioso, de ambíguo. Entro e saio nela quase sem dar por isso, às vezes mesmo não reparo ou não sei se estou para trás ou fiquei aqui e agora. De dia sou menino, à noite velho caquéctico e o contrário também pode acontecer. Às vezes demoro-me mais tempo num dos extremos ― são o que eu chamo as minhas crises. Outras, ainda, acumulo os tempos, crio-me uma infância lógica e paralela, ganha-me uma talvez pureza e fico-me a vê-la, ora maravilhado, ora irritado, ora assustado, com o olhar cheio de ronha do macróbio que já viu muito filho de muita mãe e de si próprio duvida mais do que todos e do que de todos. A verdade é que ainda não me decidi por uma idade certa, continuada. Ou um tempo.”
Pacheco, Luiz, O Teodolito, Setúbal, Estuário, 1990, p. 34.
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