“Enchi vinte e cinco páginas que foram as que me deram para encher. Escrevo como um profissional, à linha, as palavras pouco importam, são ambíguas e inúteis. As palavras não somos nós. E tu, leitor, és um pretexto: testemunha, confidente, cúmplice, vítima ou juiz, jamais nos conheceremos, jamais saberás quem sou, onde te minto, onde chorei, onde nos podíamos ambos rir a bom rir da nossa pavorosa condição de gente morta ou gente que vai morrer. Escrevo como o Hemingway ― à tabela: tantas páginas, tantas mil palavras, tantos tostões. Eis aí um morto simpático, o Hemingway, suicida carregado de glória, um milionário-suicida. Basta de mortandade, porém. Matei mais gente que a Santa Inquisição. Estou na verdade cansado.”
Pacheco, Luiz, O Teodolito, Setúbal, Estuário, 1990, p. 52.
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