"‒ Conselheiro!
Accacio curvou-se, pallido.
‒ Conselheiro, é com o maior prazer que bebo, que todos bebemos, á saúde d'um homem, que ‒ e arremessando o braço, deu um puxão ao punho da camisa com eloquencia ‒ pela sua respeitabilidade, a sua posição, os seus vastos conhecimentos, é um dos vultos d'este paiz. Á sua saude, Conselheiro!
‒ Conselheiro! Conselheiro! Amigo Conselheiro!
Beberam com ruido. Accacio, depois de limpar os beiços, passou a mão tremula pela calva, levantou-se commovido, e começou:
‒ Meus bons amigos! Eu não me preparei para esta circumstancia. Se o soubesse d'antemão, teria tomado algumas notas. Não tenho a verbosidade dos Rodrigos ou dos Garretts. E sinto que as lagrimas me vão embargar a voz...
Fallou então de si, com modestia: reconhecia, quando via na capital tão illustres parlamentares, oradores tão sublimes, tão consummados estylistas, reconhecia que era um Zero! ‒ E com a mão erguida formava no ar, pela junção do pollegar e do indicador, um 0: um zero! Proclamou o seu amor á patria: que ámanhã as instituições ou a familia real precisassem d'elle ‒ e o seu corpo, a sua penna, o seu modesto peculio, tudo offerecia de bom grado! Quereria derramar todo o seu sangue pelo throno! ‒ E, prolixo, citou o Eurico, as instituições da Belgica, Bocage e passagens dos seus prologos. Honrou-se de pertencer á Sociedade Primeiro de Dezembro... ‒ N'esse dia memoravel ‒ exclamou ‒ eu mesmo illumino as minhas janellas, sem o luxo dos grandes estabelecimentos do Chiado, mas com uma alma sincera!"
Queirós, Eça de, O Primo Bazilio: episodio domestico, segunda edição, revista, Porto; Braga, Livraria Internacional de Ernesto Chardron, Livraria Internacional de Eugenio Chardron 1878, pp. 454-455.
Eça de Queirós na sua última residência de Neuilly
c. 1893
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